Vozes da Cidade: adolescentes surdos se expressam sobre sua cidade

O Projeto Vozes da Cidade foi dialogar com os estudantes surdos da Escola Wilson Lins – que também funciona como Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS) – localizada em Ondina. A turma evidenciou os obstáculos presentes em uma sociedade que não está preparada para incluí-los. Foi por meio do encontro, realizado nos dias 3 e 4 de setembro, que os adolescentes mostraram quais os problemas mais contundentes que os cercam em Salvador, as causas dos mesmos e as possíveis soluções – problemas que, possivelmente, nunca foram ditos por eles, por falta de quem os perguntassem.

Ao serem questionados sobre o que queriam para a melhoria de Salvador, os estudantes destacaram que a sociedade não percebe os incômodos por quais passam, a exemplo da falta de acessibilidade em lugares públicos, como bancos e hospitais. “Ninguém tem sensibilidade e nenhum lugar é preparado para nos receber; nem hospital, nem delegacia, nem órgão do governo. Temos sempre que contar com alguém para falar por a gente. Quando temos um disponível”, enfatiza a estudante do CAS, Juliana Soares da Silva. Já Fernanda Ribeiro destacou como solução, a oferta de “cursos profissionais para surdos, como o de cabelereira”. Além disso, foram sugeridas, como melhorias plausíveis para a cidade, a maior oferta de escolas com Língua brasileira de sinais (Libras), e profissionais que atuam como intérprete.

E essa visão não é apenas dos surdos. Josenaldo Oliveira, professor de educação física da escola, enfatiza que há necessidade de um maior número de intérpretes. O professor, que não enxerga muitos avanços na educação inclusiva, diz ser viável conversar com crianças e adolescentes surdos, e adverte que está na hora de aplicar o que eles dizem, para assim ajudá-los. Em concordância com Josenaldo, o professor Anselmo de Jesus, que foi aluno da escola e esteve à frente da turma participante do projeto, ressaltou a importância do Vozes da Cidade ter incluído os surdos na escuta. “Eles existem; são pessoas normais, capazes. É importante incluí-los dentro dos processos políticos”, disse.

Como comunicar?

Lucas Lima tem 13 anos e cursa o terceiro ano. Além da surdez, Lucas possui dificuldades de mobilidade. O estudante mostrou que a melhor solução, para os problemas apresentados em sala, é aprender a língua de sinais para se comunicar. “A minha família não sabe libras”, diz Lucas que mora apenas com o pai. Ele quer que o pai aprenda a língua, para poder se comunicar com mais eficiência – atualmente eles conversam por gestos, mas Lucas afirma que nem sempre é compreendido.

Os embates da comunicação também se mostraram presentes durante o encontro do projeto. Marília Rios, coordenadora do projeto nos Territórios da Barra, Pituba e Itapuã, diz ter percebido mais veementemente o quanto é importante aprender libras – apesar de ter contado com a intérprete Juanete Oliveira, responsável pela interlocução entre a coordenadora de área do projeto e a turma de surdos. “Se eu soubesse libras, seria mais tranquilo. Fiquei limitada por não saber libras”, disse.

Para ela, são nesses momentos que fica perceptível o quanto é importante ir até essas crianças e adolescentes, e entender o que elas têm a dizer. E o sentimento de que o projeto alcançou o objetivo de dialogar com os estudantes surdos fica comprovado na atitude de Felipe Soares, que ao sair da sala onde foi realizado o encontro, procurou a professora Maria Isabel de Oliveira, para demonstrar sua alegria em participar do Vozes da Cidade. “Ele disse, apontando para a sala de onde saíra, que era muito bom o que estava acontecendo”, contou a professora.

Essa foi a segunda escuta e formação sobre direitos de participação política com surdos realizada pelo Vozes da Cidade. A primeira foi realizada uma semana antes na Associação Educacional Sons do Silêncio (AESOS).

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